Um colapso na principal circulação do Oceano Atlântico, conhecida como Amoc (Circulação Meridional de Revolvimento do Atlântico), pode ter consequências devastadoras e irreversíveis para o clima global. De acordo com uma carta aberta assinada por 44 especialistas de 15 países, os riscos desse fenômeno foram “grandemente subestimados”. Entre os signatários, o oceanógrafo e climatologista Stefan Rahmstorf, do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto Climático, alerta que o aquecimento global está acelerando esse processo, com impactos catastróficos para a Terra.
O que é a Amoc?
A Amoc é um sistema de correntes oceânicas que transporta calor do Oceano Atlântico tropical para o norte. As águas quentes da superfície fluem em direção ao Atlântico Norte, liberando calor na região subpolar, ao sul da Groenlândia e oeste da Grã-Bretanha. Após perder calor, essas águas resfriadas afundam a profundidades entre 2.000 e 3.000 metros, retornando para o sul como uma corrente fria. Esse sistema é um dos maiores transportadores de calor do planeta e desempenha um papel crucial no clima da Europa, na absorção de CO2 pelos oceanos e na distribuição de oxigênio nos mares.
Diferença entre a Amoc e a Corrente do Golfo
A Amoc e a Corrente do Golfo estão conectadas, já que o fluxo norte da Amoc passa pela Corrente do Golfo, uma corrente quente e rápida que se origina no Golfo do México e flui ao longo da costa dos EUA em direção à Europa. A Amoc contribui com apenas 20% do fluxo de água da Corrente do Golfo, mas é responsável pela maior parte do transporte de calor, já que sua corrente de retorno é extremamente fria, funcionando como um “sistema de aquecimento central” para o Atlântico.
O que está acontecendo com a Amoc?
Indícios sugerem que a Amoc está desacelerando nos últimos 60 ou 70 anos devido ao aquecimento global. O sinal mais alarmante é uma “mancha fria” no norte do Atlântico, única região do planeta que esfriou nas últimas duas décadas, enquanto o restante da Terra aqueceu. Este é um sinal claro de que menos calor está sendo transportado para essa região, exatamente como previam os modelos climáticos em resposta à desaceleração da Amoc.
Outras evidências do enfraquecimento da Amoc
Outros sinais de que a Amoc está enfraquecendo incluem um aquecimento excessivo ao longo da costa leste da América do Norte. Isso ocorre porque a desaceleração da Amoc empurra a Corrente do Golfo para mais perto da costa. Além disso, o teor de sal na água do Atlântico norte está em seu nível mais baixo desde que começaram as medições há 120 anos. Esse fenômeno está diretamente relacionado à desaceleração da Amoc, que traz menos água salgada e quente dos trópicos.
A importância da salinidade
A salinidade da água do mar é crucial para o funcionamento da Amoc. Quando a água é menos salgada, ela se torna menos densa, o que dificulta o afundamento necessário para impulsionar a circulação oceânica. Portanto, quanto menos sal na água, mais lenta será a circulação da Amoc. Este processo cria um ciclo vicioso: à medida que a Amoc enfraquece, a água fica menos salgada, o que por sua vez enfraquece ainda mais a circulação.
O que está causando a mudança na salinidade?
O aquecimento global afeta diretamente a salinidade, intensificando o ciclo da água com mais evaporação nos trópicos e mais precipitação nas regiões subpolares. Além disso, o derretimento das geleiras e da camada de gelo da Groenlândia adiciona água doce ao oceano, diluindo ainda mais a salinidade e enfraquecendo a Amoc.
O ciclo de feedback amplificador
Esse processo cria um ciclo de feedback: à medida que a Amoc enfraquece, a região subpolar se torna menos salgada, o que acelera o enfraquecimento da Amoc. Esse ciclo pode continuar indefinidamente, mesmo que as emissões de gases de efeito estufa sejam interrompidas, levando ao eventual colapso do sistema de circulação oceânica.
Quando a Amoc pode atingir o ponto de não retorno?
A grande incerteza é saber quando a Amoc atingirá o ponto de não retorno. Esse ponto crítico é difícil de prever, pois depende de variações sutis na salinidade, taxas de precipitação e derretimento da Groenlândia, que são complexas de modelar com precisão. Estima-se que o colapso da Amoc possa ocorrer ainda neste século.
O que dizem as previsões?
Há alguns anos, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) estimava que as chances de colapso da Amoc neste século eram inferiores a 10%. No entanto, estudos mais recentes indicam que um colapso provavelmente será desencadeado nas próximas décadas. Especialistas agora avaliam o risco em cerca de 50%.
Já passamos do ponto crítico?
Embora seja improvável que já tenhamos ultrapassado o ponto de não retorno, os cientistas não descartam completamente essa possibilidade. O colapso total da Amoc pode levar de 50 a 100 anos para se concretizar, o que dificulta a identificação precisa de quando esse ponto foi ultrapassado. No entanto, os especialistas acreditam que ainda há tempo para evitar o colapso completo.
Quais seriam os sinais de colapso iminente?
Monitorar o fluxo de água no Atlântico e observar a mistura profunda de inverno nas regiões subpolares são formas de detectar sinais de colapso da Amoc. Se a mistura profunda começar a diminuir significativamente, isso pode indicar que estamos nos aproximando do ponto de não retorno.
Consequências de um colapso da Amoc
O colapso da Amoc teria impactos climáticos massivos, incluindo o resfriamento do hemisfério norte, especialmente no noroeste da Europa. Haveria também uma mudança no cinturão tropical de chuvas, levando a secas severas em algumas regiões e enchentes em outras. Além disso, o nível do mar no Atlântico Norte poderia subir meio metro, agravando os efeitos do aquecimento global.
Impacto nos ecossistemas oceânicos
O colapso da Amoc também afetaria profundamente os ecossistemas oceânicos. A redução no fornecimento de nutrientes e oxigênio para as profundezas do Oceano Atlântico teria um impacto devastador na biologia marinha e na pesca, ameaçando a sustentabilidade das espécies marinhas que dependem dessas correntes para sobreviver.
O efeito sobre a captura de CO2 pelos oceanos
Atualmente, a Amoc ajuda a transportar grandes quantidades de dióxido de carbono (CO2) das águas superficiais para as profundezas do oceano, onde ele fica armazenado por longos períodos. Com o enfraquecimento ou colapso da Amoc, a capacidade dos oceanos de absorver CO2 seria severamente reduzida, acelerando o processo de aquecimento global.
O colapso da Amoc traria algum efeito positivo?
Algumas regiões poderiam sentir um equilíbrio entre o resfriamento causado pelo colapso da Amoc e o aquecimento global. No entanto, o efeito dominante seria um aumento na variabilidade climática, com invernos mais rigorosos em partes da Europa e verões mais quentes em outras regiões. Isso levaria a eventos climáticos extremos, prejudicando a agricultura e aumentando o número de tempestades severas.
A comparação com outros pontos de inflexão climáticos
O colapso da Amoc é apenas um dos muitos pontos críticos climáticos que a Terra enfrenta. Outros exemplos incluem o colapso de recifes de corais, a degradação da Amazônia e o derretimento das camadas de gelo na Groenlândia e na Antártida, que podem elevar o nível do mar em metros ao longo dos próximos séculos.
O que pode ser feito para evitar o colapso da Amoc?
A solução está na redução das emissões de combustíveis fósseis e no combate ao desmatamento. Cumprir o Acordo de Paris e limitar o aumento da temperatura global a 1,5°C é essencial para impedir que esses sistemas críticos entrem em colapso. A ciência é clara: o futuro do planeta depende de ações urgentes para frear o aquecimento global.
Resumo para quem está com pressa:
- O colapso da Amoc teria consequências devastadoras e irreversíveis para o clima global.
- Indícios sugerem que a Amoc está desacelerando devido ao aquecimento global, com uma “mancha fria” no Atlântico Norte.
- O ponto de não retorno pode ser atingido nas próximas décadas, com estimativas de 50% de risco de colapso neste século.
- O colapso traria secas, inundações, aumento do nível do mar e maior variabilidade climática no hemisfério norte.
- A capacidade dos oceanos de absorver CO2 diminuiria, acelerando o aquecimento global.
- A redução nas emissões de combustíveis fósseis e o combate ao desmatamento são essenciais para evitar o colapso da Amoc.